STJ nega pedido do Grupo Americanas para reunir ações de produção antecipada de provas movidas por quatro bancos credores em diferentes juízos de São Paulo.
O pedido restou indeferido pelo STJ ao argumento que a Recuperação judicial não exige a formação de um juízo universal para deliberação das ações movidas em face da empresa.
O Ministro Raul Araújo fundamentou sua decisão no sentido de que não há notícias de que os juízos, onde se processam as ações de produção antecipada de provas, tenha feito imposição de elevados custos de modo a comprometer o patrimônio da Recuperanda e que, por tal motivo, não haveria conflito de competência, devendo as ações serem processadas perante os juízos comuns.
Ousamos divergir do entendimento adotado pela Corte Superior.
Se o objetivo da Lei n.º 11.101/05, conforme previsão do artigo 47, é "viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica" nítido que a concentração das ações de produção antecipada de provas perante o Juízo Universal permitirá o conhecimento acerca de fatos que terão interferência direta na Recuperação Judicial.
Além disso, eventual prova pericial realizada sobre os mesmos fatos, além de gerar economia na produção de um único trabalho pericial, implicam em evitar-se conclusões contraditórias, em flagrante interesse na preservação da segurança jurídica, além, é claro, da economia de atos processuais e desoneração dos custos e endividamento da empresa em Recuperação Judicial.
A atuação dos bancos, não apenas na Recuperação Judicial do Grupo Americanas, mas em diversas outras Recuperações Judiciais, usualmente coloca em discussão a viabilidade da empresa em moratória, instaura uma crise de confiabilidade no mercado e reduz drasticamente o acesso ao crédito da empresa em Recuperação Judicial, dificultando ainda mais o cenário econômico da empresa em dificuldade.
Assim, vislumbra-se que a decisão proferida pelo Ministro Raul Araújo se mostra na contramão da Lei n.º 14.112/2020.
Nos termos da pertinência temática Resp 1187404/MT, oportuna a transcrição da análise realizada pelo Ministro Luis Felipe Salomão acerca dos objetivos e princípios que inspiraram a edição da norma que regula a recuperação judicial (Lei n.º 14112/2020), concluindo que o espírito dos dispositivos é preservar a função social da empresa e corolários daí decorrentes:
“Cumpre sublinhar também que, em se tratando de recuperação judicial, a nova Lei de Falências traz uma norma-programa de densa carga principiológica, constituindo a lente pela qual devem ser interpretados os demais dispositivos. Refiro-me ao art. 47, que serve como um norte a guiar a operacionalidade da recuperação judicial, sempre com vistas ao desígnio do instituto (...). Com feito, a hermenêutica conferida à lei 11.101/05, no particular relativo à recuperação judicial, deve sempre se manter fiel aos propósitos do diploma. Vale dizer, em outras palavras, nenhuma interpretação pode ser aceita se dela resulta circunstância que - além de não fomentar - inviabilize a superação da crise empresarial, com consequências perniciosas ao objetivo de preservação da empresa economicamente viável, à manutenção da fonte produtora e dos postos de trabalho, além de não atender a nenhum interesse legítimo dos credores.”
É certo que, pelo relevante poder econômico do grupo Americanas no varejo Brasileiro, ainda teremos muitas discussões envolvendo sua Recuperação Judicial.
Artigo escrito pela advogada Daniele Caroline Vieira Lemos de Souza, integrante do escritório Pazzoto, Pisciotta & Belo Sociedade de Advogados.
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