Diante das grandes dificuldades impostas aos setores de eventos e turismo pelas medidas de distanciamento social, devido à pandemia da COVID-19, em maio de 2021, foi publicada a Lei n° 14.148/2021, oriunda do PL 5.638/2020, de autoria da Câmara dos Deputados.
Inicialmente, o Projeto de Lei foi aprovado em março pelo Senado Federal. No entanto, após um debate acalorado e a sanção com vetos pelo Presidente da República, a Lei que prevê um plano de recuperação para os setores de eventos e turismo foi promulgada em março de 2022.
A medida legislativa criou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), que, entre medidas de negociação de dívidas, prevê a aplicação de alíquota zero para os principais tributos federais (PIS, COFINS, IRPJ e CSLL) pelo prazo de 60 (sessenta) meses.
Em outras palavras, nos termos do texto original da Lei n° 14.148/2021, as empresas que atuam no setor de eventos e/ou turismo não precisariam recolher o PIS, COFINS, IRPJ e CSLL pelo período de 5 (cinco) anos, contados a partir da data de publicação da lei, até maio de 2026.
Enquanto a medida representa um grande benefício para as empresas que atuam nesses setores, uma vez que as isenta de boa parte de sua carga tributária, para o Estado o benefício se tornou um grande problema de gestão fiscal e orçamentária, já que, graças à alíquota zero, deixa de ser captada uma significativa arrecadação fiscal de um dos setores que mais expandiu desde o fim da pandemia.
Apesar do interesse do Fisco em revogar ou restringir o PERSE, conforme tem tentado desde a promulgação da lei, a redação do artigo 4º, caput, da Lei n° 14.148/2021 invoca uma limitação à revogação ou modificação do benefício: a alíquota zero foi concedida por um prazo certo e mediante condições determinadas.
Nesse sentido, o texto normativo atrai a aplicação do artigo 178 do Código Tributário Nacional, o qual impede a revogação ou modificação de isenção concedida por prazo certo ou em função de determinadas condições. Sendo assim, o encerramento do programa só poderia ocorrer pelo decurso do prazo estabelecido por lei, sendo vedada qualquer modificação em seus efeitos.
Porém, tal óbice não impediu o Governo Federal de editar medidas que limitam as empresas enquadradas no PERSE ou, mais recentemente, que revogam por completo o benefício concedido pela Lei n° 14.148/2021. A patente ilegalidade dessas medidas causou uma grande insegurança jurídica e a judicialização em massa dessa discussão.
Em seu texto normativo, o artigo 2° da Lei nº 14.148/2021, considera pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas que exercem, de forma direta ou indireta, as atividades econômicas indicadas nos incisos I a IV, dentre os quais se incluem os serviços turísticos, nos termos do art. 21 da Lei nº 11.771/2008.
No entanto, o §2º do mesmo artigo prevê a possibilidade de um Ato do Ministério da Economia indicar os Cadastros Nacionais de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos. Essa determinação foi efetivada através da Portaria ME nº 7.163, de 21/06/2021, que dividiu os CNAEs enquadrados na definição de 'setor de eventos' em duas categorias distintas, conforme encontradas nos Anexos I e II da referida Portaria.
Aos CNAEs listados no Anexo I, a Portaria condicionou o enquadramento da empresa no PERSE ao exercício da atividade desde a data da publicação da Lei nº 14.148, em 03/05/2021. Por sua vez, para os CNAEs previstos no Anexo II, a Portaria estabeleceu como condição que a empresa possuísse cadastro no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (CADASTUR), desde a publicação da lei, em 03/05/2021.
Diante das muitas controvérsias acerca da legalidade das limitações trazidas pela Portaria, que, além de tudo, se trata de um ato administrativo interno sem força de lei, o Governo Federal publicou a Medida Provisória nº 1.147, de 2022, posteriormente convertida na Lei nº 14.592, de 30 de maio de 2023, que incorporou para o texto legal os critérios estabelecidos na Portaria ME nº 7.163, restringindo ainda mais as atividades econômicas contempladas pelo benefício do PERSE.
Mais recentemente, em dezembro de 2023, foi publicada a Medida Provisória nº 1.202/2023, que, entre outras atribuições, trouxe o aumento progressivo de alíquotas para as empresas contempladas no programa, além de revogar o benefício do PERSE a partir de 1° de abril de 2021, em relação às Contribuições (PIS; COFINS e CSLL), e a partir de 1° de janeiro de 2025, em relação ao IRPJ.
Tal medida causou muita controvérsia e debates no âmbito político e jurídico, o que resultou na edição da Medida Provisória nº 1.208, de 2024, que revogou parcialmente os dispositivos da Medida Provisória nº 1.202/2023. Porém, apesar de revogar o artigo que previa a progressão da alíquota, chama-se a atenção que a nova Medida Provisória manteve a revogação do benefício da alíquota zero.
A revogação do benefício, prevista no art. 6°, I, da Medida Provisória nº 1.202/2023, começou a ter seus efeitos, em teoria, a partir de 1° de abril em relação ao PIS, COFINS e CSLL. Ou seja, as empresas que faziam uso do benefício devem retornar a recolher esses tributos a partir de abril de 2024.
Aqui usa-se a expressão "em teoria", uma vez que tal revogação pode ser considerada ilegal, por força do art. 178 do CTN, e inconstitucional, uma vez que enquanto não convertida em Lei, uma Medida Provisória não tem o condão ou força normativa para revogar uma lei.
Nesse sentido, a recomendação para os beneficiários do programa é ingressar junto ao judiciário para ter reconhecida a ilegalidade da exigência do recolhimento do PIS, COFINS e CSLL.
A discussão ganha ainda mais força com o ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 7609 perante o Supremo Tribunal Federal, em março de 2024. A ação, movida pelo partido político PODEMOS (PODE), pretende a declaração da inconstitucionalidade da Medida Provisória nº 1.202/2023 e a manutenção do benefício concedido pelo PERSE.
Enquanto aguardam um posicionamento erga omnes da Corte Superior sobre o assunto, o que pode demorar, não resta alternativa aos contribuintes senão buscar seus direitos individuais através do judiciário, de modo a garantir o aplicação da alíquota zero de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL pelo prazo previsto em lei, ou seja, até maio de 2026.
Artigo escrito pela advogada Ana Laura Faria Rodrigues, integrante do escritório Pazzoto, Pisciotta & Belo Advogados.
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